Casamentos que curam
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Casamento e cura; que relação é essa? Falar de cura em casamento pode parecer realmente muito estranho, porque cura normalmente é uma expressão atribuída a algo que adoeceu. Apesar da estranheza, a palavra é, sim, muito adequada à relação conjugal. Os casamentos inegavelmente são passíveis de adoecimento. Aliás, quaisquer relações podem enfermar. Sob uma ótica terapêutica, onde existe doença, existe necessidade, carência e também potencial de completude. 

A convivência, muito antes de ser algo que se compartilha com o outro, é algo que reflete a forma como nos relacionamos com nós próprios. Nela, projetamos a sombra e a luz que trazemos em nós. Quando duas pessoas se encontram em um casamento, em verdade, estão procurando no outro aquilo que é capaz de curar o seu sombrio e burilar os seus talentos.

Essa é uma visão bem junguiana de casamento, mas também uma visão coerente com o Espiritismo. A questão 386, de O Livro dos Espíritos, ressalta: “Um do outro, dois seres se aproximam devido a circunstâncias aparentemente fortuitas, mas que, na realidade, resultam da atração de dois Espíritos que se buscam reciprocamente por entre a multidão.”

Já na questão 388, os guias espirituais reafirmam: “Entre os seres pensantes há ligação que ainda não conheceis. O magnetismo é o piloto desta ciência, que mais tarde compreendereis melhor.” 

Há todo um complexo de energias por trás das relações humanas. É verdadeiramente um campo muito vasto para se estudar e examinar, para melhor entendimento da saúde e do desenvolvimento humano. Esse magnetismo é realmente algo que começa a ser examinado pelas ciências modernas, especialmente a física quântica, abrindo um terreno muito vasto para uma medicina energética curativa e libertadora.

Nessa teia de energias e vibrações, cada um de nós busca aquilo que precisa e merece. Portanto, necessidade e merecimento são forças interiores que atraem na vida tudo que é para nosso progresso e evolução.

 

Opostos que se atraem

Vamos dar um exemplo disso no casamento. Duas pessoas se apaixonam. Uma busca na outra algo que falta e algo que complementa. Um homem sereno e calmo poderá atrair uma mulher agitada, ansiosa e determinada. Ele, por sentir uma extrema necessidade de ser mais ativo, encontrará um enorme interesse por essa mulher realizadora. Ela, por sua vez, perceberá a serenidade dele como ponto de equilíbrio para seus excessos. Tudo isso, na maioria das vezes, acontece de forma inconsciente. Aquilo que falta a ambos será fator determinante dessa atração. A sombra de um foi em busca da luz que tem no outro. Há uma “química psíquica e energética” antes de rolar uma química da paixão.

Depois, esses apaixonados se casam e, com o tempo, os choques naturais desse enlace emergem do inconsciente para o consciente. Ela, segundo ele, cobra demais dele. E ele, segundo ela, é excessivamente calmo. Começam a lidar mal na convivência, porque já tinham uma relação muito desgastante com o seu próprio sombrio que, agora, emerge abruptamente. 

Aí entra o propósito terapêutico e libertador do casamento: compreender o quanto é necessário esse encontro com o sombrio pessoal. E, diante dessa compreensão, surge o desafio de aprender como aplicar mecanismos que reciclem a convivência e garantam melhores resultados para essa descoberta dolorosa, porém, essencial para nossa paz e cura. 

Essa linha de raciocínio fundamentada na ciência é algo que necessitamos agregar com urgência aos exames dos casamentos à luz do Espiritismo, porque, muitas vezes, em função de preconceitos, distanciam a união afetiva da sua utilidade educativa no crescimento espiritual.

A visão mais ajustada com o bom senso e com as diretrizes da educação espiritual é a de que, quando você se casa com alguém, não existe resgate ou karma com o outro. 

 

Resgate de dívidas?

Existe, sim, compromisso de resgate, antes de tudo, consigo próprio. Não um resgate de algo ruim que foi feito no passado, todavia, o resgate de nossa saúde, de nossos valores, de nossas qualidades eternas. Casamento é uma oportunidade de reconciliação interior, de resgatar a si próprio. E somente nessa perspectiva, ampliando os nossos recursos pessoais, é que reunimos condições para algo realizar também em favor da iluminação alheia. Esses são os casamentos que curam. 

Por conta de rigidez no entendimento e ausência de reflexão acerca dos princípios espíritas, muitos casais têm mantido casamentos que já acabaram há muito tempo e vivem uma vida paupérrima de alegria e aprendizado, mantendo-se um ao lado do outro para “queimar o karma”. Sofrem, fazem sofrer e se iludem com a ideia de que isso é necessário ao avanço espiritual, e que as coisas estão como estão porque são velhos inimigos espirituais.

Pode até ser verdade que sejam velhos inimigos, mas daí a usar isso para explicar o adoecimento da relação vai uma grande distância. Nesse caso, o que existe é incapacidade de nossa parte em gerenciar condições afetivas e de conduta para estabelecer um convívio saudável e curativo. Em verdade, os velhos inimigos estão é dentro de nós próprios, escondidos em nossa sombra emocional e psíquica. Com eles é que urge um processo de pacificação e recuperação.

As chances de cura de um casamento terminam quando os dois perdem a motivação de descobrirem suas sombras pessoais e como iluminá-las; quando ambos perderam o gosto de se amparar mutuamente. Casamentos não terminam apenas com a separação. A separação apenas oficializa o que já pode ter acontecido há um bom tempo. 

Uma diferença crucial: o casamento, nesse caso, acaba, mas talvez o ciclo de cura ainda não. Possivelmente amanhã, nessa mesma vida ou em outra reencarnação, essas mesmas pessoas encontrarão novamente pessoas atraentes e novamente aquela “química psíquica” de necessidades vai determinar novos encontros e, talvez, desencontros...

Como nos disse o preto-velho Pai João de Angola: “Estamos querendo levar o balaio de dores do outro em nossas costas.”

 

Exigências indevidas

Em muitos casamentos encerrados, um costuma querer mudar o outro, um querendo salvar o outro para resgatar a harmonia dos primeiros momentos de união. E, no entanto, ambos estão frágeis, cansados, desiludidos e dependentes. É o adoecimento do casamento. Por isso, aceitam a manipulação do outro, engolem maus tratos, sofrem mágoas todos os dias e acolhem passivamente as perturbações e vícios supondo, dessa forma, estar realizando uma boa ação pela recuperação do casamento. 

Definitivamente, uma frase que parece ser um verdadeiro atentado contra todas as nossas crenças mais sombrias e limitadoras precisa ser dita: nós não devemos nada a ninguém! Parece uma frase de egoísmo, entretanto, ela encerra um profundo ensinamento em que precisamos meditar. É da lei divina que, em relação ao outro, todos nós podemos cooperar, orientar e estender amparo. Porém, é também da lei que cada um só responderá por si. Há muita ilusão nesse assunto.

É muito desafiante, mesmo, ter um amor exigente, um amor que impõe e educa. E, na lei de Deus, verdadeiramente não temos nenhuma obrigação de suportar, levar nas costas ou carregar quem não queira o seu próprio bem. Muitas vezes, amar significa uma postura firme, determinada, e que alerte o outro sobre limites e abusos que ele já não respeita mais. 

Eu sei que todas essas reflexões parecem frias. Lembra-nos aquela postura de Jesus, em Mateus 12:48: “Ele, porém, respondendo, disse ao que lhe falara: Quem é minha mãe? E quem são meus irmãos?”   

Casamentos que curam amadurecem e nos permitem outros ciclos mais promissores e estáveis de aprendizado, sejam na relação corrente ou em novas relações. Tais casamentos atendem aos seus propósitos divinos e nos conduzem de volta ao nosso melhor, à nossa luz pessoal.

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